Wednesday, 11 December 2013

Quem já sofreu "bullying" levanta a mão!

Eu tenho um grande ressentimento do fato de que, até hoje, não encontramos uma palavra em português que traduza o termo "bully". E quanto a grande mídia descobriu que podia usar esse termo sem traduzi-lo, houve um frenesi total, como se o "bully" tivesse chegado ao Brasil no ano passado. Por conta desse tratamento excessivo e abusivo da mídia, houve uma reação forte a esse termo, e muita gente dizendo que isso é bobagem; afinal, no tempo deles, isso não existia. As histórias são muitas: se a criança chegasse em casa e dissesse que apanhou no colégio, ela apanharia dos pais por não ter revidado. Eu ficaria sem dedos se fosse contar quantas vezes eu ouvi essas.

Não quero entrar no mérito aqui se apanhar em casa por ter apanhado no colégio ajudou ou prejudicou. Minhas opiniões são nebulosas e meio difíceis de serem absorvidas, afinal, nem todo adulto se sente confortável em admitir que ainda carrega traumas e mágoas de seu tempo de infância, inclusive causadas por seus próprios pais (é nessas horas que a nostalgia entra em campo pra pintar o passado com canetinha e esconder essas manchas inconvenientes). Vou deixar isso de lado por um momento; se eu for discutir isso, não vai ser agora.

A questão é, "bullying" sempre existiu; no mínimo, desde que nossos ancestrais primatas aprenderam a andar em pé. A questão é que nunca demos um nome para isso. Cada caso de "bullying" se via como um caso isolado, único, e não como um fenômeno social generalizado. É claro que o "cada caso é um caso" é vantajoso em certos aspectos, mas é importantíssimo olhar para o lado e ver se a mesma coisa não acontece com outros, e tentar traçar paralelos. A impressão que eu tenho é que isso era pouco praticado; e agora, que o "bullying" virou "moda", muita gente ficou com a impressão de que fazer isso vai ser simplesmente seguir a modinha. É "bobagem de psicólogo". É coisa de 'pedagogo que não tem o que fazer". E por aí vai.

Mas eu posso falar, com toda a segurança, que eu sofri "bullying" no colégio. Não digo isso como vítima indefesa que precisa de um afago, e aparecer no Fantástico pra falar de como eu sofri. Não, eu digo isso com indignação, com raiva, que é a única maneira decente que eu vejo de encarar esse problema. Apesar de ter quase 30 anos agora, os efeitos desse tratamento no colégio ainda reverberam: eu sempre tenho receio de que eu não sou desejado no ambiente onde estou, que as pessoas em segredo me detestam, e de que ninguém suporta ouvir minha voz. Afinal, era assim que eu me sentia no colégio todos os dias, e de certa forma, eu estava certo. Alguns colegas realmente pensavam isso tudo de mim: me detestavam apenas por eu existir. Afinal, éramos crianças, e estávamos no colégio. Onde já se viu um professor de ensino fundamental ensinar valores como respeito e tolerância? É mais importante nos fazer copiar textos do livro, ou ler história e geografia sem aprender a interpretar.

Éramos crianças, e não aprendíamos a pensar no próximo como um indivíduo, com sentimentos e emoções próprias. Ninguém sentia empatia pelas minhas mágoas, porque isso era difícil; mais difícil do que resolver expressões matemáticas com colchetes! Os colegar que praticavam "bullying" em mim não me suportavam, porque eu era diferente; eu lembrava a eles, simplesmente pelo fato de eu existir, que o mundo não era do jeito que eles queriam. Eu era a mosca na sopa deles. E eu reconheço que eu realmente agia dessa forma: eu perambulava pelo pátio repetindo meus pensamentos eu voz alta, eu imaginava coisas e as escrevia no caderno como se elas realmente existissem (eu só fui descobrir anos mais tarde que tem gente que ganha dinheiro fazendo isso!), eu tinha horror a futebol (o que me alienava de 95% das aulas de Educação Física -- sim, nós ainda temos "professores" que acham que Educação Física é atirar uma bola no meio do pátio e tomar refrigerante por uma hora e meia) e adorava informática. Eu era um alienígena na sala de aula, e alguns colegas se sentiam ofendidos com isso. Eu era a lembrança constante de que eles não eram o centro do Universo.

Dizendo isso tudo, parece até que eu estou justificando e inocentando aqueles que me provocavam e me agrediam. É claro que não: masoquista, eu não sou. Essa mágoa eu carrego até hoje, e todas as vezes que eu tentei engoli-la só me fizeram mal. Eu não aceito essa, assim como eu não aceitava na época. Eu tinha que fazer alguma coisa, e portanto eu tentava me defender: eu retrucava, eu xingava de volta, eu partia pra cima, eu brigava. E aí, o que acontecia? Ia eu pra direção, chamavam a mãe no colégio, eu ouvia lição de moral, como se eu fosse o causador de tudo aquilo. Para os adultos do colégio, a tentativa de me defender da opressão me igualavam aos meus opressores. Eu era taxado de brigão, de bagunceiro, junto com todos aqueles que me machucavam sem eu ter feito nada. É claro que, para eles, ir pra direção e assinar ocorrência era uma coisa comum e normal; se os pais eram chamados no colégio, não era nada de mais. Para eles, ir pra sala da vice-diretora era tão normal quanto jogar bola na Educação Física. Já para mim, era uma catástrofe nuclear: eu devia ser o garoto disciplinado, o garoto estudioso, inteligente, de notas altas e cabeça baixa. Eu era o garoto quieto, introvertido, e eu deveria ser repreendido? Por tentar me defender?

Portanto, a repressão não vinha só dos "bullies" na sala de aula, mas também dos adultos. Claro, estes últimos não faziam isso deliberadamente: eles erravam na tentativa de ajudar. Mas a ajuda que eles ofereciam dificilmente podiam ser piores. Eu ouvia coisas do tipo "quando eles te provocarem, não dá bola, que daí eles vão cansar". Gente, entendam uma coisa: isso não funciona. Não é assim que o "bully" funciona. Ele não cansa. Se a piadinha não dá efeito, ele atira papelzinho amassado na minha cabeça. Se o papelzinho não resolve, ele atira giz. Se o giz não dá efeito, ele arranja outra coisa. As provocações vão aumentando até que eu estoure. E o "bully" sabe que eu vou estourar em algum momento, isso é garantido. Ignorar só piora. Fingir que não machuca só piora, pois machuca igual, e a mágoa fica contida. O "bully" só vai parar de provocar e agredir quando ele se sentir ameaçado, pois enquanto ele não sentir no rosto a dor do soco, ele vai continuar dando socos, pois sempre existe a recompensa. O ladrão não vai cansar de roubar enquanto ele ganhar dinheiro. O "bully" é assim também.

Mas como é possível reagir e devolver as agressões quando eles vêm de grupos? Sim, isso acontece também. O "bully" muitas vezes vêm em grupos. Não é sempre aquela coisa de filme americano, em que o "bully" é um garoto isolado e marginalizado, proveniente de um lar disfuncional e arruinado. Em todas as vezes que eu fui vítima, sempre fui vítima de um grupinho. Eu até tentava brigar, mas era sempre sabendo que eu estava em desvantagem. E além da desvantagem natural de ser sozinho contra um grupo, ainda vinha a repreensão na vice-direção. Às vezes, nem era propriamente uma repreensão, mas sim um "conselho de amigo" -- que, como eu já disse, não funciona. É uma realidade meio triste, mas não deixa de ser real: quando a pessoa só entende a linguagem da violência, ela só vai mudar de pensamento quando ela se encontrar do outro lado do soco, quando ela vir que suas armas também podem ser usadas contra si. A linguagem da paz e do amor não funciona com quem sequer sabe ouvir, e todos nós sabemos que as nossas escolas são péssimas para ensinar isso, e alguns lares são ainda piores.

Eu nunca apanhei em casa por ter apanhado na rua. Nesse aspecto, meus pais foram totalmente sensatos. Eles até me incentivavam a me defender, mas no fundo eu sabia que não era assim tão fácil. Me defender dos colegas à base de socos poderia até dar efeito, mas e dos adultos? Como dizer pra vice-diretora que ela não entende nada sobre ser criança? Como dizer que ignorar é pior? Como convencer aqueles que acham que sabem tudo?

Notem que, até agora, eu sempre falei sobre crianças. Agora pensem que essa situação mudou pouco até eu sair do ensino médio. Sim, as agressões físicas praticamente desapareceram, mas a situação era a mesma. As provocações e ferimentos continuavam constantes, e a auto-defesa permaneceu um crime. O que fazer em uma situação dessas? Para um adolescente, que tem ainda mais necessidade de se expressar e de se impor, o problema é agravado, e as alternativas se tornam mais definitivas: a gente explode de vez e manda todo mundo pro inferno, ou a gente se torna ainda mais reclusivo e absorvido pelo próprio mundo, ou a gente vira um sociopata aguardando pelo momento certo de invadir o colégio com uma metralhadora e mandar todo mundo pro inferno de uma forma um pouco mais literal. Eu fiquei com a segunda opção; menos por escolha e mais por não ter coragem de explodir e nem a crueldade de matar ninguém. Provavelmente foi a menos danosa para mim, mas eu ainda sinto as consequências. E é apenas encarando nossos problemas que nós podemos resolver. Se eu não posso voltar no tempo e encarar meus "bullies" da maneira que eles realmente mereciam, eu posso hoje escrever esse texto e dizer que, sim, "bullying" é um problema real e constante em nossa sociedade, e não, não é drama de filme da Sessão da Tarde nem bobagem de pedagogo.

Você pode até pensar que suas brigas de infância são coisa do passado, ou até pensar que elas sequer existiram; mas se você não tem medo de encarar o fato de que o passado está dentro do presente, pense duas vezes no assunto. Talvez alguns dos problemas que você encare hoje sejam fruto de uma sociedade que até hoje não entende direito as crianças e os adolescentes. Eu demorei muito tempo e precisei de ajuda para chegar a essa conclusão; não é coisa que venha fácil.

E se você teve paciência de ler até aqui, use alguns neurônios a mais e, por favor, me ajude a achar um termo decente para "bullying". Eu me sinto sujo escrevendo e falando essa palavra.

Monday, 11 March 2013

Promise kept! "2:32" released

The album that I said would be coming out this month is out! And, happily enough, in the exact date that I wished. You can download it from my website, which, by the way, has a new address: http://www.ferniecanto.com.br/. The album, titled 2:32, is available here: http://www.ferniecanto.com.br/2-32, and you can download it in both MP3 and FLAC formats (as well as all my previous albums). You can also listen to the whole thing on SoundCloud: https://soundcloud.com/fernie-canto/sets/2-32-full-album.

As the title suggests, every track in that album has the length of 2 minutes and 32 seconds exactly. Why? Mostly to see what kind of stuff would come out. The album was a good exercise to put some random ideas that were bubbling in my head, and also to exercise a more purely electronic and abstract sound. There are plenty of weird textures and rhythms going on, but also some neat fragments of melody -- and Bach pieces as well. Check it out, it's nifty.

Friday, 14 December 2012

This long delay

So it happened that the whole year of 2012 has went by without a single new composition by me, and the last post in this blog was made 16 months ago. But that doesn't mean that stuff hasn't happened. Stuff did happen, it always does. As for musical stuff, if things run smoothly and nice, 2013 shall be a quite productive year.

For one, there'll be a new album coming out in March. This date is definitive, because the album is already done, and it only hasn't been put out yet for reasons that shall be disclosed when the time is right. And I've also got a fairly big project under production; for now it's entitled Don't Stay in the City, and its current shape is an "album in two parts", with seven tracks in total, and a combined length of about 70 minutes. That one is still a work in progress, and there are no predictions of release dates and so on, but it's gonna be a pretty nice record. I'll probably publish part one as soon as its done, and then move on to finish part two.

Thursday, 25 August 2011

New album published: 3 7 4 11 2 5

My newest album is already available for free listening and download on Jamendo: 3 7 4 11 2 5 features six tracks, all entirely instrumental, with a radically more electronic and abstract sound than my previous releases. The title of the album is a numeric pattern used to determine most -- but not all! -- of the rhythmic aspects of the music in different scales, from within each individual measure, to the album as a whole. All of the melodies, harmonies, instrument choices and everything else were NOT generated algorithmically, however.

Sunday, 14 August 2011

Eleven Gifts in depth, part 11: v

This was one of the easiest songs to conceive -- and I mean easy in a good, self-assuring way, not in a dismissive way, if you know what I mean. Basically, this song was begging to be written; firstly because, since it would be the closer of the suite, I wanted it to be VERY different, upbeat and sparkling; and secondly because it matched exactly the mood I wanted for it. It was a win-win situation, and I can't think of any better piece to fit in here.

Yet, it's the simplest song in the set - a boogie-woogie, nothing more, nothing less. Of course, me being me, I just have to twist it somehow; and the best way to do that was to use unexpected chords -- in this case, modulating from C major to C-sharp major, and so on and on, culminating in a crescendo over a diminished chord, and back to the main key. It didn't need to be anything else. It's one of my favourite tunes in here, for being so effective.

Eleven Gifts in depth, part 10: t

This short piece came to my head in one lucky, inspired moment. I don't know exactly what prompted me, but I was seeking for a slow, solemn theme that transmitted a stately, not exactly sad, but poignant feel. Not that there's any special significance to this track, but I wanted it to have a different feel from the others. I guess I was thinking of using the sustain pedal for an enhanced effect, and when this sequence of notes hit my head, I scribbled them down on a notebook, with the working title of "Pedal".

Writing it was very easy a fast -- the song pretty much wrote itself from start to end. It uses a pretty predictable trick halfway through, which is to switch to what would be the relative major key, but in the minor key. In practical terms, the song starts in G minor, which has B-flat as its relative major key, but the song switches to B-flat minor instead. Yet, the tail end suggests a major key, and I like the effect of the trailing notes, which creates a hazy, ambiguous tonality.

Just not I realised that G minor and B-flat minor are exactly the two keys used in the song The Wedding, by the Legendary Pink Dots, which is also a piano led track which I truly, really love -- but I don't think I knew that particular song back then! A minor coincidence, I believe...

Tuesday, 9 August 2011

Eleven Gifts in depth, part 9: s

I have to admit, I was scraping the bottom of the barrel for this one tune. I was out of ideas! All the other tunes just came to me one way or another: either the idea hit me on the right moment, or I remembered I had something that fit; but for this one, neither occurred. So I sort of "cheated": I started listening to old songs from the "project" mentioned in the "c" and "i" posts, trying to see if I could salvage something, but without much hope. Then, suddenly, this incredible bass riff hit me in the face: I had completely forgotten it, and not only it was brilliant and perfect for this spot, but I was delighted to write a "reggae" for the cycle. All I had to do was to start writing.

The beauty here is that I didn't have to change any melodic content at all from its original incarnation. The left hand melody was left intact, chord changes and all, and all I had to do was write the right hand staccatos, and make a crescendo lasting for the whole composition. I was amazed at how good it turned out. This was the very last piece I wrote for the cycle, and after it, I just started recording. A very happy ending indeed.